quarta-feira, 20 de abril de 2016

As lembranças de Bolsonaro

A fala do deputado Jair Bolsonaro, ao justificar seu voto a favor da admissibilidade do pedido de impeachment da presidente Dilma, na sessão da Câmara dos Deputados no dia 17 de abril, declarando homenagear com seu voto o coronel Brilhante Ulstra, causou polêmica. Setores habitualmente rotulados como esquerda e direita se dividiram quanto a esse pronunciamento.
Na esquerda a reação foi a previsível. A OAB logo veio a público, por meio de algum de seus dirigentes, dizer que a entidade classista dos bacharéis não deixaria impune a fala do deputado na tribuna parlamentar. No campo da direita, sem se chegar ao extremo de propor retaliações ao parlamentar por sua intervenção no plenário, também houve reações de desgosto.  O respeitado colunista Reinaldo Azevedo condenou com veemência a fala do deputado do PSC, em seu programa "Pingos nos ii", na Rádio Jovem Pan. Reinaldo sempre é um homem que se preocupa em fundamentar os seus textos e suas falas. O Movimento Brasil Livre, um dos principais organizadores e inspiradores da grande mobilização popular dos "coxinhas" também demonstrou descontentamento com a fala do deputado. 
O Coronel Carlos Alberto Brilhante Ulstra morreu na madrugada de 15 de outubro de 2015, em Brasília, em decorrência de um câncer e de complicações cardíacas. Vários integrantes do Ministério Público Federal o haviam acusado por ser responsável por mortes e torturas que teriam ocorrido em dependências do II Exército, mais especificamente na repartição denominada DOI-CODI, que foi comandada por Ulstra nos anos 70. O doutor Paulo Esteves, advogado que defendia o coronel, declarou, no dia da morte de Ulstra que "ele morreu sem nunca ter sido condenado". Não faltou com a verdade. Em declarações à imprensa o advogado afirmou que "uma decisão liminar do Supremo Tribunal Federal suspendeu todas as ações propostas pelo Ministério Público Federal contra o ex-chefe " DOI-CODI. “A Corte assim decidiu por causa da Lei da Anistia.”
Segundo o site "Fatos Desconhecidos" (visualizado dia 20 de abril de 2016, endereço da página: http://www.fatosdesconhecidos.com.br/quem-foi-carlos-alberto-brilhante-ustra/)  "Ustra lançou dois livros: Rompendo o silêncio, em que narra sua passagem pelo DOI/CODI, no período de 1970 a 1974, além da Operação Bandeirante (OBAN). Em 2006, lançou o livro A Verdade Sufocada, em que conta sua versão dos fatos que viveu durante a ditadura. O livro possui dez edições publicadas e a soma das tiragens ultrapassaram vinte mil exemplares."
Em suas obras o coronel Brilhante Ulstra, mostrando-se ousado em se levantar contra a verdade oficial e vencedora, justificava suas ações na época com o argumento de que se não tivesse havido ação dos militares a guerrilha teria vencido e implantado no Brasil a "ditadura do proletariado", um regime então inspirado no que havia na União Soviética, China, Albânia, leste europeu e que ainda mantém vestígios em Cuba e na Coreia do Norte. 
Há coisas que não podem ser negadas. Os guerrilheiros que se juntaram em organizações armadas para derrotar o governo militar tinham como objetivo implantar o socialismo. Isso é fartamente provado por toda a documentação, inclusive panfletos, distribuídos por esses grupos naquele tempo. Segundo, houve excessos dos militares na repressão. Houve torturas, desaparecimentos e mortes, além de prisões injustas. 
Consideremos que, se a maioria dos brasileiros nunca quis viver sob um regime ditatorial comunista, também a maioria dos brasileiros não aceita a ideia de que tenha havido tortura e excessos nos quartéis e delegacias de polícia naquele período, como não aceitaria hoje tal ideia. 
A fala do deputado Bolsonaro trouxe à tona velhos fantasmas e não parece bom que nesse momento de crise política, econômica, moral e impasses gravíssimos na vida nacional, que esses velhos fantasmas apareçam para assombrar uma cena conturbada. O que não pode parecer admissível para pessoas sensatas é que haja, na direita, setores que chegam ao extremo de não admitir que houve excessos no período considerado e que haja, na esquerda, setores que chegam ao extremo de negar que o objetivo da luta armada naqueles tempos era a implantação da "ditadura do proletariado" e que o comunismo foi o regime que mais matou, por execuções, torturas e prisões, além de miséria e fome, mais pessoas em toda a história da humanidade.