sábado, 4 de junho de 2016

Os manuscritos de Nag Hammadi, o contexto de seu escondimento e descobrimento - pequena introdução

Os manuscritos de Nag Hammadi foram descobertos em dezembro de 1945, ano que marca o fim da Segunda Guerra Mundial. Há que se considerar a época em que aparecem, que era de dor e profundas transformações que se seguiriam nos anos posteriores. Foram encontrados por dois irmãos egípcios que procuravam fertilizantes em cavernas. Os manuscritos foram conservados por mais de um milênio em um vaso lacrado, escondidos no deserto. É comumente aceito que, após as definições do Concílio de Niceia, monges de um mosteiro próximo à região tenham escondido esses manuscritos, preferindo agir assim do que destruí-los. Os manuscritos permitiram revelar uma faceta.

O cristianismo foi introduzido e se popularizou no Egito nos primeiros séculos da era cristã. Diz a tradição que teria sido introduzido pelo evangelista São Marcos, que teria sido bispo de Alexandria. No Egito que surgiu o monaquismo, sendo os mosteiros egípcios os mais antigos que conhecemos na cristandade. (1)
O fundador desses primeiros mosteiros foi São Pacômio. O primeiro destes mosteiros primitivos foi estabelecido entre 318 323em Tabennisi, no Egito. (2) Não conhecemos a localização exata de Tabennisi (atualmente não existe), onde São Pacômio fundou a primeira comunidade cenobítica. Sua localização é estimada no Sul do Egito (Alto Egito). Mas a atividade do santo fundador dos primeiros mosteiros da cristandade desenvolveu-se entre Luxor (atual Al-Uqsur) e Akhmim, mais ao norte. Nessa região o santo organizou nove mosteiros para homens e dois para mulheres durante os 25 anos de seu ministério. O centro geográfico da região onde São Pacômio criou os mosteiros é Nag Hammadi. Todos os mosteiros tinham a mesma organização e o mesmo padrão de construção (3).

A hipótese mais aceita para explicar o fato dos documentos terem sido escondidos em uma área de difícil acesso, em uma região cheia de cavernas, é que monges de um mosteiro próximo teriam o retirado do mosteiro onde viviam e os escondido lá. O motivo para essa deliberação e ação teria sido o concílio de Nicéia, que procurou dar unidade à Igreja. Essas obras não seriam mais aceitas pela Igreja a partir daí. Sendo verdadeira essa hipótese, ela levanta um outro lado da questão. Até então essas obras frequentavam bibliotecas de mosteiros e eram lidas e discutidas por monges e fiéis.

O concílio de Nicéia foi o primeiro concílio universal, ecumênico, com participação de todos os líderes da Igreja. Seu objetivo principal era combater a doutrina de Ário, que era muito popular na ocasião, a ponto de ter a simpatia do próprio imperador Constantino. O arianismo negava a divindade de Cristo, afirmando que não havia n'Ele substância divina, mas que ele seria uma criatura de Deus. Negava também a doutrina da Santíssima Trindade. (4) (5)

Existe uma proximidade do arianismo com o gnosticismo, segundo alguns teólogos, até porque foram dois movimentos contemporâneos(6). Podemos notar que a condenação formal do arianismo no Concílio de Nicéia acabou levando a um esconderijo remoto em uma região desértica os documentos hoje conhecidos como manuscritos de Nag Hammadi.

A maior parte dos documentos refere-se ao gnosticismo egípcio ou siro-egípcio, a vertente ocidental do gnosticismo histórico, e são documentos, majoritariamente, pertenciam aos gnósticos chamados setianos, sobre os quais, em determinado momento, o platonismo passou a exercer importante influência..(7)

Notas.


(1)“O Cristianismo existe no Egipto desde a sua aurora. A tradição atribui a evangelização naquela região ao Evangelista São Marcos, que terá sido bispo de Alexandria.
Desde os primeiros tempos da era cristã Alexandria assumiu uma enorme importância na Igreja Universal. Era um grande centro de educação cristã e só se encontrava atrás de Roma na hierarquia dos primeiros quatro Patriarcados – Roma, Alexandria, Antioquia e Jerusalém.
(2)”Ao perceber a força do cristianismo, Pacômio introduziu a vida monástica comum baseada na disciplina e na autoridade, substituindo os anacoretas. Os anacoretas eram os monges que viviam sozinhos no deserto. Os problemas desta vida individualizada começaram a se tornar insustentáveis. Pacômio resolveu fundar um mosteiro, com regras definidas, onde todos pudessem viver em comunidade. O mosteiro tinha uma estrutura rígida, baseada na disciplina e na obediência. Era formado por vários edifícios ou casas, construídas dentro de muralhas. Havia também uma igreja, um refeitório, uma cozinha, uma hospedaria e uma biblioteca. A base da vida religiosa era constituída pela castidade, pobreza e obediência ao superior. Pontualidade, silêncio, disciplina, recitação de certas preces, algumas penitências, tudo isso fazia parte do dia a dia de um mosteiro. São Pacômio morreu em 348, Na época os mosteiros por ele fundados abrigavam cerca de sete mil monges.”

(3) Foi na região do Egipto que nasceu a tradição do monaquismo, preconizada por Santo Antão. Ainda hoje os mosteiros são uma pedra angular da cultura e espiritualidade cristã copta, incluindo uma iconografia muito rica e distinta.”

(5) http://www.ecclesia.com.br/biblioteca/historia_da_igreja/primeiro_concilio_ecumenico_de_niceia.html


John D. Turner (2001). Sethian Gnosticism and the Platonic Tradition Presses Université Laval [S.l.] pp. 257–. ISBN 978-2-7637-7834-1.